domingo, 24 de outubro de 2010

SEM TÍTULO (V)


No lugar onde o vento pára
acalmam os olhos rasos de tempestade.
Imobilizam-se os poros da terra
repousa o cardo,
a urze, a esteva.
O dorso do rio prende a canção nocturna
enquanto a lua suspende a respiração.
Nas estrelas o estremecimento pára
e as aves recolhem o voar.
Do céu um silêncio parido
abençoa a terra sem o mais leve movimento.
Ela é a única que se eleva
para não se afogar na virgindade do silêncio.


MV

sábado, 16 de outubro de 2010

ISABEL MONTEVERDE


Fecho os reposteiros, para recordar.
A luz chega-me do interior,
Doce, dourada, sobre as vinhas ,
(poeira a repousar sobre as vírgulas)
Cobrindo-lhes as formas e o fulgor.


Tão frágil, como a vida dos pirilampos,
(ou nos cantos da casa as lembranças)
É, deste sonho, o despertar para a dor.
Não te quero aprisionar.
Quero ver-te voar.
Quero ver-me transcender,
As letras soltas, ao entardecer
MV

Uma última e singela homenagem à artista plástica, amiga e grande mulher ISABEL MONTEVERDE, com a publicação de um dos seus poemas  e de um dos seus trabalhos plásticos.
Obrigada Isabelita, por tudo o que comigo partilhaste.

sábado, 9 de outubro de 2010

ÀS VEZES


Às vezes basta-me a lua
a descansar no dorso do rio
ou o poente a imobilizar a planície.
Um riacho vagabundo
a adormecer um dossel  de ervas
ou o rebentamento de uma aragem morna
a escorregar do azul inocente do céu.

Às vezes basta-me o dia a abrir-se
com lassidão 
ao tenro botão de rosa.

Que imensa e pura beleza!

Apetece-me aplainar
as irregularidades que trago na alma,
ocultar todos os receios nas pálpebras.

E logo nos olhos me bailam danças
em que as asas feridas
se soturam com fios de alegria.

MV

domingo, 3 de outubro de 2010

VENTO



 Maestro de orquestra do ar
de batuta em direcções livres.
Algazarra de línguas desentendidas
entre as malhas frágeis do silêncio.
Açoita e algema nuvens
que choram gotas desiludidas,
desalinha a serenidade do ar,
grita canções asfixiadas,
desfaz carreiros de formigas
em furiosas golpadas.
Ateia o lume da fogueira
entre palavras quase abrasadas.

Vento! Símbolo arruaceiro do coração,
voz da poesia onírica escrita pelas mãos.

MV