sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

SOBRE A MESA


Lápis de cristal
vagaroso
a colher palavras.
Borracha de seda
em recusa do risco apagar.
O rascunho do poema
sobre a mesa
ousa começar.

Marcas desamparadas
aconchegam-se na raiz do papel.

Sopram ventos que se cruzam
sem dependência das mãos.
As palavras rugem a fracturar-se
e o rascunho do poema
sobre a mesa
fica por acabar.

MV

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

PALAVRAS À CHUVA


Por entre a chuva passam palavras
que ficam transparentes
e que espelham tudo o que me envolve.
Ou ficam negras e toscas
ofuscando o que sinto.
Quero pintá-las de branco
da cor da lua e da cal
mas o branco da paleta sumiu.
Pinto-as, então de lágrimas
e, aí, perdem a forma e o cheiro
esquecem-se do sonho
e tornam-se invisíveis
aos olhos pintados de nada
à espera do branco da paleta
da cor da lua e da cal.

MV

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

PENSAMENTO IMPLACÁVEL

Dissequemos as ideias que percorrem o pensamento.
Esqueçamo-nos de recordações
que os pardais teimam em cantar no telhado.

Imprevisibilidade!
Escassos são os instrumentos de precisão
e a mão treme na hora da incisão.

Implacável é o pensamento.

MV


domingo, 2 de janeiro de 2011

INDECISÃO


Assim viver
entre sol e sombra
é como acordar
e ver com olhos nublados
o voo dos pássaros.

Assim viver
é humilhar o acordar de cada dia.
É ter uma mão a refrescar-se no rio
e a outra a queimar-se em brasas de carvão.

É acto de cobardia
suspender assim as mãos do destino
sabendo que ele pode ser quartzo,
pássaro,
onda calma,
estrela de olhos a sorrir
ou
pedra fria,
víbora,
charco de lama.

Decide, que as indecisões perfuram o peito.

Escolhe a sombra
e vive em escombros deixados pela saudade.
Ou escolhe o sol
e sonha enquanto um  único raio brilhar.

Ou não escolhas
e vegeta.

MV