segunda-feira, 25 de agosto de 2008

PANO DO PÓ



Acordei o sossego da tarde. Vou fazer limpeza à casa. Urge limpar o pó. Rejeitei o habitual aspirador. Escolhi o melhor pano do pó.
Esvaziei a estante cheia de futilidades. E pus o pano a limpar. Limpei até me doerem as mãos. Começaram a vir agarradas ao pano muitas teias, tecidas com o que sinto hoje no peito. Descanso, olho o pano e vejo letras, muitas letras numa dança frenética para se agruparem. Conseguiram. Palavras, muitas palavras vão surgindo: “ausência, ternura, incerteza, chama, insegurança…” Páro de ler. Abro a janela e sacudo o pano. Vejo voar uma palavra que não sei se conheço. E não me importo. Deixo-a voar até desaparecer.
Quero voltar a pôr tudo na estante, como estava antes. As mãos recusam-se. Os sentidos renunciam a arrumação. Zango-me. Pego em tudo e atiro de qualquer maneira, sem eira nem beira.Surpreendo-me com este momento estranho… cada coisa foi instalar-se no seu lugar. Sem saber que fazer vejo, em jeito de asa esvoaçante, a palavra Amor a arrasar os meus cabelos. Tento apanhá-la para a deitar fora. Não sou capaz. Instala-se na estante com letras triunfadoras.
Pego outra vez no pano, dobro-o em quatro e arrumo-o no seu espaço. Sento-me cabisbaixa e deixo vir o pensamento em voos livres.
Não vale a pena limpar o pó.

MV

2 comentários:

f@ disse...

Com essa magia toda que tem o pano de pó... acho que vale a pena sim...para ver voar as palavras e as sentir... esse pó e o pano devem ter um encanto qualquer ... se até a palavra amor lhe foi parar aos cabelos...
belo texto...mto mesmo...
beijinhos das nuvens

mundo azul disse...

...será que não? Geralmente quando queremos fazer uma boa faxina, tem aquele nosso lado acomodado, que resiste...Acho que seria bom tentar novamente...

Seu texto é ótimo! Muito original!

Beijos de luz e o meu carinho...